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Conto:T.M.M. – O cruel destino de um homem bom.

Olá Pessoal! Este é um conto que o escritor Roberto Camilotti nos cedeu para que os nossos leitores, você, leia e conheça mais um pouco de sua obra magnifica!





Timóteo Maria Melgaço era um homem comum, de passado sério, que vivia sempre nos conformes, um fiel cumpridor das leis e dos seus deveres. Trabalhava de encaixotador numa montadora de eletrodomésticos em São Bernardo, cidade onde, de segunda a sexta, pegava três conduções para poder trabalhar. Vivia num bairro popular e tinha uma vida sem graça, quase morta. Certo dia, Timóteo voltou para casa preocupado com seu emprego. A crise financeira finalmente atingia a montadora em cheio, pois mais da metade dos seus colegas de turno estavam sendo dispensados. As duas décadas de absoluta dedicação ao trabalho não pareciam ser um motivo suficientemente razoável para que não fosse demitido. Teria como gratidão a ingratidão do olho da rua e o resto simplesmente não importava. Seu futuro na empresa era incerto. Cada vez mais, Timóteo se convencia de que estavam planejando uma injustificável injustiça contra ele e não conseguia disfarçar o que sentia. O abalo era visível no seu rosto. Andava sempre de cabeça abaixada. Era viúvo e pai de três filhos: Julienne, que tinha dezenove anos, Filipe, um ano mais velho que a irmã, e Zlatan, o filho mais velho e o único que trabalhava. Zlatan trabalhava na montadora com o pai, era auxiliar de limpeza e fazia questão de ajudar no sustento da família com seu emprego. Dava todo dia cinco do mês, quando recebia o salário, metade dele. Os outros cinquenta eram divididos entre ele e a pensão da filha que teve com uma namorada de adolescência. Timóteo Maria Melgaço se preocupava com os três filhos muito além do que a si próprio e, agora que corria o risco de perder o emprego, essa preocupação se fazia maior. Era uma segunda-feira quando foi chamado à diretoria para conversar sobre sua situação. Enquanto se dirigia à sala se despediu dos colegas que viu no caminho, já pensando no pior e tendo, ele, a certeza que seria demitido. Mas não foi isso o que aconteceu. Ao fechar a porta e sentar-se diante de Valdivino, que era seu chefe e encarrego na direção do setor de montagem, ouviu o impensável, uma proposta que prontamente recusou com um murro na mesa e saiu da sala batendo a porta. Definitivamente agora não seria mais demitido. Pediria demissão e procuraria todos os seus direitos, sem exceção de nenhum deles. Valdivino era um homem arrogante, supremo senhor de si, e Timóteo, por sua vez, não o admirava por causa disso; tinha por ele uma conveniente tolerância para justamente não perder o emprego. Essa tolerância, então, chegara ao fim. Tão logo o enfurecido encaixotador deixou a sala, Valdivino foi correndo ao seu encalço e o obrigou que retornasse, agarrando-o pelo braço e ameaçando-o com virulência. Os funcionários da montadora assistiam a cena, pasmados, só aumentando a indignação de Timóteo. Não obstante, Valdivino enfim conseguiu convencê-lo a retornar à sua sala, onde puderam recomeçar a conversa. Ele refez a proposta, só que desta vez com menos precipitação, brusquidão e grosseria e dizendo respeitosamente que garantiria o seu emprego com a condição de que Julienne se casasse com ele. Assegurou que a amava enormemente e que daria tudo de bom para ela. Timóteo ouviu ainda a promessa de que a filha seria tratada com carinho, dedicação e respeito. Acabou por aceitar a proposta, afinal precisava do emprego para sustentar a família e manter a sua batalhada honra de homem provedor.
Cabia apenas o milagre de fazer com que a filha aceitasse o casamento. Timóteo deixou a sala de Valdivino e retornou ao trabalho, e de noite, ao chegar em casa, foi logo procurando Julienne para conversar. Disse primeiramente que trazia uma ótima notícia: a notícia de que ela tinha um admirador secreto, um pretendente que não conhecia existir. Julienne, sem saber o que responder e de certa forma achando que o pai estava brincando e fazendo piada da sua solteirice, riu, pedindo que ele deixasse de travessura. Timóteo Maria, no entanto, não externou qualquer sinal de que brincava. Em tom de voz sério, revelou que o tal admirador era o seu chefe, Valdivino, no qual ela somente havia visto em duas oportunidades: na festa de aniversário de um colega de setor e numa confraternização de fim de ano na empresa em que foi convidada pelo próprio pai. Julienne achou a conversa do pai um completo absurdo e um despropósito. Não amava Valdivino e tampouco se lembrava de alguma vez ter deixado transparecer coisa do tipo. Valdivino era mais velho do que ela, aparentava ter a mesma idade do pai e peremptoriamente julgava que esse casamento, se por alguma desgraça acontecesse contra sua vontade, já estava fadado a não dar certo. Tão ligeiro percebeu que a filha se mostrava irredutível, Timóteo se ajoelhou aos prantos, implorando que aceitasse Valdivino como homem e que garantisse assim seu emprego e por consequência a manutenção do sustento da família, Julienne reconsiderou a decisão. Nunca havia visto o pai tomado por tamanha angústia e desespero. Aceitou o casamento e casaria-se tão logo o zeloso genitor determinasse. Passado um mês, Julienne e Valdivino se casaram. Na cerimônia estavam todos da família Melgaço da cidade de São Bernardo: Timóteo, a própria Julienne e os dois irmãos, Filipe e Zlatan, que a viram se casar sem saber do acordo da irmã com o pai. Começaram a desconfiar quando, acidentalmente, ouviram o pai agradecê-la de maneira fervorosa por um certo favor que ela lhe prestara. Na ocasião, Timóteo e Julienne conversavam na sala quando os irmãos, que discutiam no quarto sobre coisas sem importância, abriram a porta e ficaram em silêncio, ouvindo, curiosos, o que eles conversavam. Num primeiro momento não entenderam que diabo de favor era esse que Julienne havia prestado, porém, após investigarem em segredo toda a história, não demoraram a descobrir a verdade, dias depois, pela boca da própria Julienne que revelou porquê se casara com Valdivino. Filipe, transtornado e furioso com a audácia do pai, saiu de casa na mesma hora da descoberta. Filipe levou consigo apenas a roupa do corpo e passou a morar na rua. Zlatan, por sua vez, que tinha um temperamento oposto do irmão, frio e calculista, exteriorizou ao pai que continuava sem saber de nada. Durante dias, seja na empresa ou em casa, ele o tratava fingidamente com respeito e cordialidade. Zlatan agiu assim até o momento em que conseguiu vingar a irmã, o que também não demorou a se suceder. Uma noite depois de um dia exaustivo de trabalho armou-lhe uma emboscada numa pracinha mal iluminada, telefonando-o e dizendo que precisava falar com ele urgentemente, pois a vida de Filipe corria perigo, e que tinha de estar na praça ainda naquela hora, sem falta. Sequer transcorreu a hora e Timóteo Maria Melgaço já se encontrava, esbaforido, diante do filho. Foi logo indagando o que acontecia de tão grave para chamá-lo na praça, mas Zlatan nada o respondeu. Sacou o revólver e enterrou cinco balas no peito de Timóteo que ainda teve tempo de olhar nos olhos do filho, num semblante completamente esvaziado, e agonizar antes de morrer. Tal frieza não fosse suficiente, a ira era tamanha que Zlatan avançou com a vingança, apanhando um facão que havia escondido no mato e decapitando o corpo do próprio pai. Ao deixar a pracinha e ir para a casa levou consigo a cabeça dentro de um saco. Daria-lhe um destino diabólico no dia seguinte que acordou com o olhar avermelhado, fúnebre e irreconhecível e se arrumou para ir trabalhar.
Ele ajeitou a cabeça numa caixa de madeira, forrada pela metade com uma mistura de cal e mato, e a levou para o trabalho, onde, ao chegar na montadora, cumprimentou os colegas e se dirigiu para a sala da diretoria. Não encontrou ninguém. Zlatan, então, colocou a caixa encima da mesa, deixou a sala e voltou para junto dos colegas. Tranquilo, começou a trabalhar como se rigorosamente nada houvesse acontecido. Valdivino nunca pôde mensurar o susto que tomou quando abriu a caixa. A cabeça ainda pingava sangue.
                              

                                                                        FIM

Autor: ROBERTO CAMILOTTI


Não deixem de ler sua entrevista e comprar o livro desse grande autor! 

Um comentário: Leave Your Comments

  1. Oi, beto, td bom?

    Passando para avisar que criei um blog. Nele, estou postando outros contos.

    Segue lá e deixa um comentário no que gostar; já estou seguindo o "estúdio".

    Sucesso p/ nós!

    Abraço.

    http://robertocamilotti.blogspot.com/

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